14.8.10

480. Do Livro do Desassossego - X

Todo o dia, em toda a sua desolação de nuvens leves e mornas foi ocupado pelas informações de que havia revolução. Estas notícias, falsas os certas, enchem-me sempre de um desconforto especial, misto de desdém e de náusea física. Dói-me na inteligência que alguém julgue que altera alguma coisa agitando-se. A violência, seja qual for, foi sempre para mim uma forma esbugalhada de estupidez humana. Depois, todos os revolucionários são estúpidos, como, em grau menor, porque menos incómodo, todos os reformadores.

Fernando Pessoa

12.8.10

479. Do Livro do Desassossego - IX

O homem superior difere do homem inferior, e dos animais irmãos deste, pela simples qualidade da ironia. A ironia é o primeiro indício de que a consciência se tornou consciente.

Fernando Pessoa

10.8.10

477. Do Livro do Desassossego - VII

Quanto mais alto o homem, de mais coisas tem que se privar. No píncaro não há lugar senão para o homem só. Quanto mais perfeito, mais completo; e quanto mais completo, menos outrem.

Fernando Pessoa

8.8.10

475. Do Livro do Desassossego - V

Que é viajar, e para que serve viajar? Qualquer poente é o poente; não é mister ir vê-lo em constantinopla. A sensação de libertação, que nasce das viagens? Posso tê-la saindo de Lisboa até Benfica, e tê-la mais intensamente do que quem vá de Lisboa à China, porque se a libertação não está em mim, não está, para mim, em parte alguma.

Fernando Pessoa